Rock In Rio e a Hipocrisia de alguns "fãs"

Rock in Rio/Divulgação
Rock In Rio

A cada edição, o evento divide opiniões. Algumas sensatas, mas a maioria infantis, baseadas em vontades embaladas pela zona de conforto da idolatria. Embora o evento já tenha passado de muitas edições, em momentos completamente distintos da história recente da música, ainda figuram anacronismos, verbalizados de maneira imatura.


O Rock In Rio é um negócio. Há todo um planejamento bem prévio, para que tudo saia o mais próximo possível das previsões. A direção não está lá muito preocupada se o Zé Sweep ou a Maria Oba Oba vão reclamar de determinado artista X figurar em tal palco, ou artista Y merecer apresentações. Há uma rede de parceiros e colaboradores que veem o melhor para o evento, o que não significa, necessariamente, ser melhor para o Rock ou Metal. Parece bastante óbvio, entretanto, isso não é refletido nas constantes reclamações, toda vez que o evento tem lugar no calendário. Fato é que o Rock In Rio continua um evento poderoso, ostentando uma estrutura faraônica e cumprindo o manual do Barnum. Vale a pena conferir a obra “Marketing de Eventos”, de Leonard H. Hoyle Jr. Percebemos ali, o quanto os Medinas beberam em Barnum. Ressalto aqui, segundo a obra “Metendo o Pé na Lama: os Bastidores do Rock in Rio de 1985”, de Cid Castro, ilustrador da icônica imagem que representa parte da marca, que o próprio Roberto Medina vislumbrava um evento só de Rock N’ Roll, mas que os patrocinadores brigaram por artistas Pop do mesmo calibre. Logo, se você quer reclamar que Rock In Rio deveria ter só Rock, reclame com os patrocinadores.


Undergroundwashing?

A sala de imprensa do Rock in Rio Reprodução/VEJA

Já de algumas edições, a direção vem aplicando uma prática bastante interessante, liberando credenciais para veículos de cobertura menores, muitos deles undergrounds, bem como a inserção de bandas undergrounds no line-up, que coexistem conosco no “mundo real”, mesmo que sejam em palcos alternativos e/ou menores. Essa prática vem surtindo o efeito de diminuir a taxa de rejeição do evento, já que, nas primeiras edições, era impossível imaginar que isso pudesse acontecer. Parafraseando os criadores do termo Sportswashing, poderia batizar a prática de “Undergroundwashing”, convertendo a imagem do evento para os adoradores de música que não via valor aos artistas menores.


Hipocrisia de fã?

Foto: Projeto PulsoHipocrisia de fã


Deixo uma pergunta a você: Até onde você curte Rock/Metal? É curioso como as pessoas não conseguem definir de maneira concreta o significado de qualidade. É natural, partindo do pressuposto que “Qualidade” é estritamente subjetivo. Já quanto ao público do Rock/Metal, há uma hipocrisia descarada, embasada na pura conveniência para não agredir a própria zona de conforto.

Tem se tornando comum, zombarias atacando o underground do Rock/Metal, depreciando artistas independentes sob qualquer motivo, inclusive, motivos dos quais os ídolos dos atacantes vem cometendo rotineiramente. Vocalistas que não aguentam mais as próprias músicas, guitarristas errando notas de canções icônicas. Enfim, dois pesos, duas medidas, tudo em prol da idolatria. Por que o mesmo argumento não vale para o seu ídolo? Eu te respondo: Porque é seu ídolo e, provavelmente — como escrevo em português — você nem sequer fez parte do crescimento deste artista. Não o acompanhou no underground, não assistiu as incontáveis vezes em que o show dele foi uma “porcaria”, quando este artista nem imaginava chegar onde está. Mesmo assim, permanece julgando bandas e artistas com estrutura completamente reduzida, sem apoio e sem espaços.


Underground x Mainstream

Foto: Rhovve RocksFacing Fear no Obcecado Pelo Mal

Parece estupidez, mas é preciso reforçar. Underground não é Mainstream e nunca será. O underground não possui o poderio financeiro, a estrutura e as nuances do mainstream. O underground possui uma cultura completamente diferente do mainstream. O underground — batizado por Jack Kerouac há muitos anos como Freak Scene — traz uma esfera totalmente distinta, onde os agentes coexistem na mesma plataforma, embora, há artistas de níveis mais avançados no underground, com uma conduta alheia à cultura underground, que não cabe a mim, julgar aqui. No mainstream, a relação é de celebridade para fã. Não há a relação direta entre artista e público, não há a comunhão aberta entre os agentes. Tampouco há comunhão sincera entre o próprio público, onde figuram apenas como religiosos em um culto de adoração. Acaba-se o culto e cada um para suas residências, rememorando as palavras e cantorias da divindade.

Você, que apenas frequenta eventos onde atuam celebridades, deve entender o que busca. Você não vai ter, no underground, uma aparelhagem de som potente e equilibrada, não terá jogos de luzes, fogos, fumaça, como visualiza nos grandes eventos. Não terá toda a suntuosidade que está acostumado aos eventos das grandes arenas. Vai se decepcionar com pessoas e situações e, se tiver a mente sábia e equilibrada, saberá separar o “joio do trigo”. O underground é outro mundo e, se você não gosta, ou não se vê neste mundo, faça o pequeno favor de não sair por aí hostilizando algo que, para muitos, é a única forma de apresentar o seu trabalho. A sua agressão gratuita pode ser a alavanca para a redução do espaço para muitos artistas, como já vem acontecendo.

 

Comentários

  1. Que texto foda, eloquência, conteúdo e argumentos. Quem é do metal tem que compreender que sem o underground não existe mainstream, quando a aposentadoria chegar pras grandes bandas, se não tivermos um sólido underground de onde sairão os substitutos?
    A galera tem que parar com o fogo amigo pra não ajudar a estigmatizarem ainda mais o metal.

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